‘Operação Transparência’ termina em 2020

Um combate sem tréguas ao garimpo

Mais de 26 mil pedras de diamante apreendidas, 227 casas de compra e venda de diamantes encerradas e mais de oito milhões de kwanzas apreendidos fazem o balanço dos primeiros 20 dias da ‘Operação Transparência’, iniciada a 26 de Setembro, com o intuito de acabar com o garimpo de diamantes e a imigração ilegal. A operação termina em 2020. O Governo nega que os repatriados estejam a ser agredidos.

Um combate sem tréguas ao garimpo
Teresa Fukiady

Muitos abandonaram a terra de origem, fugiram da fome e do desemprego e furaram aquela linha muitas vezes invisível a que chamam fronteira, sem se importarem com os riscos de chegar a Angola. Para trás, deixaram as famílias e toda uma vida com a esperança de um recomeço e de um dia regressarem com os lucros do trabalho no garimpo. Muitos vieram com uma ‘mão à frente e a outra atrás’, praticamente sem nada e sem nada regressam ao seu país. 

‘Tony’, como é conhecido, é um destes rostos. Com a família, atravessou o posto fronteiriço de Kamako, entre a Lunda-Norte e a República Democrática do Congo (RDC), em Chissanda. Já lá vão cinco anos desde que embarcou na aventura de deixar o país para buscar pedras preciosas em solo angolano, numa das províncias mais pobres do país, com mais de 50 mil desempregados.

Como a de muitos outros, a entrada de ‘Tony’ e família era apenas para uma estadia de 15 dias, através do pagamento de um visto de curta estadia, também chamado de ‘Le passé’, no valor de cinco dólares. Mas acabou por fintar o sistema e prolongou a permanência por tempo indeterminado. Até que foi ‘convidado’ a sair, depois de ter caído nas malhas da operação que está a ser desenvolvida pelas autoridades angolanas e que visa o combate à migração ilegal e ao tráfico de diamantes.

Tony é um dos cerca de 262 mil ilegais que as autoridades dizem terem deixado o país desde o início da operação, a 26 de Setembro. É um dos que saiu pelo próprio pé, ao contrário de milhares de famílias que estão a passar a fronteira de regresso ao incerto, em camiões disponibilizados, abarrotados de pessoas, mobílias, malas, roupas e outros pertences. Desde o início da operação, todos os dias chegam aos postos fronteiriços uma média de 13 mil pessoas. Todos eles, garantem as autoridades, de forma voluntária.

Apesar de as autoridades afirmarem que são ilegais e que se dedicam ao garimpo, há quem contrarie. Manuel Pedro, por exemplo, diz ser “servo de Deus” e pastor da Igreja Evangélica Plena Acção. Garante que nunca trabalhou no garimpo e que é angolano. E que está a ser empurrado do seu país: “Eu ser angolano. Eu ser pastor…”, afirma, com um sotaque que o denuncia. Quem também admite é o jovem João, que afirma ser natural de Mbanza-Congo, Zaire. “Eu sou povo angolano. Me mandaram no Congo porque não tenho bilhete”, conta o jovem, que apesar de não ter bilhete de identidade exibe um cartão de eleitor e outro de militante do MPLA. Jura ser filho de pai angolano e mãe congolesa.  

Num país onde, de acordo com os dados do Censo 2014, apenas 53 por cento da população estava registada, muitos mostram o bilhete de identidade e de eleitor que afirmam terem tratado de forma legal e com o aval da administração, informação esta confirmada pelo soba de Tchiluata, Alberto Muevu, que acusa ainda administração de conceder os documentos a estrangeiros. Situação confirmada pela polícia. “A polícia tem conhecimento. Está a trabalhar para aferir e ter provas relativas a isto”, afirma o porta-voz da ‘Operação Transparência’, António Bernardo.

Apesar de haver relatos a denunciar o contrário, o governador da Lunda-Norte, Ernesto Muangala, nega casos de maus-tratos. “Não confirmo as acusações de violações dos direitos humanos. Estão a ser bem tratados”, garante, acrescentando que entre os expulsos não estão incluídos os refugiados que se encontram no campo do Luvua. “Estes vão continuar até que os dois governos criem condições para o regresso ao país de origem”. Informação confirmada pela polícia, que garante não haver relatos de agressões.

A Organização das Nações Unidas (ONU) mostra-se preocupada e teme uma crise humana. E afirma que as expulsões em massa são contrárias às obrigações da Carta Africana, exortando os governos dos dois países a trabalharem para garantir um “movimento populacional” seguro.

Congoleses ameaçam responder

As autoridades da RDC ameaçam retaliar Angola. Citados pelo ‘Novo Jornal’, o vice-ministro dos Negócios Estrangeiros, Agée Matembo, e o porta-voz, Lambert Mende, exigem a Angola uma explicação, não afastando a possibilidade de uma acção recíproca, que pode envolver a expulsão de angolanos.

Agée Matembo levanta a possibilidade de dar uma “resposta sem paralelo”. E alerta que “será muito complicado” se houver a expulsão de mais de 20 mil angolanos, refugiados no Katanga. O aviso surge depois de haver relatos de agressões a congoleses em Saurimo. Os relatos de congoleses que deixaram Angola nos últimos dias são pontuados por descrições de violência protagonizada pelas forças policiais e militares angolanas, incluindo pilhagens e recurso a armas de fogo para os obrigar a deixarem as casas. 

Lambert Mendes afirma ser “muito grave” e que estão a decorrer investigações profundas para suportar uma resposta oficial nos próximos dias.

Em 2009, a RDC expulsou milhares de angolanos depois da aprovação pelo parlamento de uma lei que permitiu o recurso a estas expulsões como resposta a um diferendo que os dois países mantinham sobre a exploração conjunta de blocos petrolíferos em Cabinda.

 

 

 

 

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