A caminho do Partido

Mangodinho e Man-Barras, amigos de há muito tempo, caminhavam em direcção ao partido onde participariam de um encontro nacional. Falavam sobre o estado da nação e os desafios para melhorar o que desandou deste o ‘tunda mindele’ aos dias de seus netos. Foi ao passar o prédio dos Assuntos Sociais que Mangodinho desatou uma conversa que há muito incomodavam a sua garganta.

- Oh, compadre Barras, lembras-te, com certeza, tu que és daqui da Ngimbi, naquele tempo, esses prédios eram limpos, passeios sem buracos e na cidade só viviam brancos e poucos pretos civilizados...

- Pois é, compadre. Sabes porque isso ficou assim ou não sabes? – questionou Barras.

- Sei, pois. Apesar de ter mbora nascido nos mabululu, sei um kabucado de Luanda. Víamos no cinema e nos rolos embutidos em binóculos. Bastou os mindele irem embora para militarizar até os pretos que estavam civilizados. Agora está um pouco custoso endireitar isso. Eu até só estou já a pensar nos nossos netos porque a nossa leva, tirado as ideias que estamos a concertar agora, me parece já não ter tempo nem fôlego para a empreitada.

Man-Barras ficou a ouvir na defensiva, ele que é um positivista convicto.

- Compadre, Godinho, encontras aqui um bom tema para reflectirmos no partido. Mas não fica tipo atiraste a toalha ao tapete. Não há nada tão mau que não possa melhorar. Pensa só na Europa que ficou duas vezes partida em vinte e cinco anos. Cada um, independentemente da idade, da formação, do cargo e das possibilidades tem de ter ideias do tipo se eu for governante o que é que vou fazer para mudar o que não está bem no meu Sector. Tem de ter uma equipa imaginária para lhe rodearem, se subir, e fazerem boas obras. É preciso reconstruir.

- Sim, compadre Barras. É preciso reconstruir, mas a começar mesmo pelo partido. Já viste aonde é que estamos a ir?

- Mas, oh compadre? Estamos a caminho do partido. É ou não é?

- Sim. Disseste bem. Partido. O que está partido não é o destruído que precisa ser reconstruído? Eu a partir de hoje e com o optimismo que acabaste de me pregar com ele já não direi mais partido.

- Como assim. Então nós não somos membros do partido e estamos a caminho do partido para reunião nacional?

- Pois é. Aí está o problema. Fora queremos reconstruir e construir. Dentro só falámos partido aqui, partido acolá e etecetera? Porque não reapelidar de Reconstruído ou Construindo? Eu agora já não pronunciarei o nome partido!

- Ai é? Isso são ideias reacionárias, oh compadre, e muita gente pode não te ver com bons olhos...

- Então tudo pode mudar de nome menos o partido, não é? Se assim for, vamos continuar a viver no partido. Para mudarmos o estado da nação que você mesmo acha que não está bom, temos de começar pela reforma interna. Para mim, quem doravante me perguntar aonde vou e onde milito direi sempre que é no Reconstruindo. Temos de construir um novo pensamento, como o compadre bem elucidou, que é preciso civilizar os militarizados e reconstruir o que ficou partido. É ou não é, compadre?

Man-Barras, vaidoso como ninguém, endireitou o boné e estacionou o pé em uma pedra para remover a poeira no sapato. Mangodinho aproveitou comprar duas garrafas de água e lá foram, sol ardente sobre eles, a caminho do Reconstruindo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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