Medida contraria memorando assinado em Abril entre MED e sindicalistas

Actualizações de carreiras só em 2019

A actualização de carreiras, procedimento administrativo que poderá contribuir para que alguns professores passem a auferir um salário melhor, só terá início em Janeiro de 2019. O Ministério da Educação justifica o adiamento com a aprovação do próximo OGE. Entre os sindicalistas, há quem entenda que Angola tem um Executivo “não sério” e que “não honra compromissos”, pelo que deverão ouvir as bases para tomar uma decisão. A greve é um cenário que continua em cima da mesa.

Actualizações de  carreiras só em 2019
Santos Samuesseca
Guilherme Silva

Guilherme Silva presidente do Sinprof

A decisão de greve ou não cabe ao conselho nacional, que, de acordo com os nossos estatutos, é o órgão que deverá deliberar, ponderar e decidir o rumo a seguir depois de esgrimidos todos os argumentos necessários face ao momento actual.

O Ministério da Educação (MED), em concertação com os sindicatos dos professores, adiou, para Janeiro de 2019, o início da actualização das carreiras, contrariando, assim, o previsto no memorando de Abril, que havia fixado o mês passado como o período para o arranque deste trabalho. Caso este processo administrativo já tivesse início, os docentes que tenham melhorado o nível académico poderiam, ao ascender para outra categoria, auferir melhores salários.

Na semana passada, após o encontro com os sindicalistas, Isaac Paxe, coordenador da comissão de concertação do MED, justificou o adiamento com a “indisponibilidade das verbas” no actual Orçamento Geral do Estado (OGE) e assegurou que a reunião foi “consensual”, na medida em que os sindicatos de defesa dos professores concordaram com o plano do Executivo de aprovar um regime remuneratório único para a toda a função pública. Paxe, que também dirige o Instituto Nacional de Formação de Quadros do MED, não tem dúvidas de que a medida honra um “princípio constitucional”, visto que deverá pôr fim aos casos de dois funcionários públicos, com o mesmo grau académico, auferirem salários diferentes pelo simples facto de pertencerem a ministérios diferentes.

Entretanto, Adriano dos Santos, vice-presidente da Federação dos Sindicatos da Educação de Angola, confessou ao NG que não saiu da reunião tão satisfeito como gostaria, pois o encontro terminou com um impasse no que às regras de transição diz respeito. De acordo com o sindicalista, a organização de que faz parte pretende que, para a passagem para o novo estatuto, se tenha em conta não apenas a melhoria do nível académico, mas também o tempo de serviço. Já a proposta do MED é que a transição de categoria ocorra apenas para aqueles professores que tenham melhorado o nível académico.

Por exemplo, se prevalecer a proposta do MED, os professores que tenham sido admitidos com o ensino médio, mesmo que lá estejam há 10 anos, ao beneficiarem de actualização por se tornarem licenciados, passarão a ter o mesmo salário que um recém-licenciado que acaba de entrar no sector. “Onde está a valorização da experiência que este professor adquiriu ao longo tempo?”, questiona Adriano dos Santos, adiantando que a Federação dos Sindicatos da Educação de Angola vai ouvir os dirigentes e as bases para, depois, ‘voltar à carga’, apresentando uma nova proposta na próxima reunião, que está marcada para 18 deste mês.

Quem também remete para as bases a posição a assumir é o Sindicato Nacional dos Professores e Trabalhadores do Ensino Não-Universitário (Sinptenu), como confirmou ao NG Zacarias Jeremias, o secretário-geral. Dois dias depois do encontro com o MED, Jeremias participou de uma reunião, com os filiados do Sinptenu, em que os sindicalistas explicaram aos professores as vantagens e desvantagens da proposta recebida do ministério. Entretanto, só na próxima reunião com o MED é que se saberá a posição destes sindicalistas. Enquanto não chega o 18 de Outubro, Zacarias Jeremias analisa os factos com recurso a um provérbio: “Mais vale um mau acordo do que uma boa sentença.”

Sinprof irritado

Embora actualmente o MED esteja a negociar com mais dois sindicatos, foi com o Sindicato Nacional de Professores (Sinprof) que assinou o memorando de Abril. No documento, as partes concordavam em iniciar, ainda em Setembro deste ano, “a implementação gradual da nova tabela salarial a partir da base (professores auxiliares)”, como resultado da aprovação dos novos estatutos e regime remuneratório. Como tal não aconteceu, estando tudo adiado para Janeiro de 2019, há quem entenda que o Sinprof foi “ingénuo”, visto que o principal elemento de gestão do Estado é o OGE e, por isso, o MED não estaria em condições de assumir as despesas de um acordo assinado depois de o OGE ter sido aprovado.

“Temos um Executivo não-sério”, dispara Guilherme Silva, presidente do Sinprof, em reacção ao adiamento, acusando o Governo de “não honrar a palavra dada”. “Quem assinou o memorando foi o Executivo. Se o fez, foi porque sabia que tinha de cumprir. Se sabiam que não haveria dinheiro, porque é que não nos deram essa explicação ou esclarecimento técnico?”, questiona o sindicalista, que até admite que o MED esteja dentro dos prazos (o limite é Setembro do próximo ano), mas coloca dúvidas sobre a alegada garantia do Governo de a actualização de carreiras (e consequente melhoria salarial, nalguns casos) abranger todos os professores de uma só vez.

Em relação à alegada “ingenuidade” do Sinprof, ao acreditar que o Governo arcaria com despesas não contabilizadas na elaboração do OGE, Guilherme Silva recorda que a organização que dirige havia negociado “com quem tem o saco do dinheiro” e, por isso, havia razões para se acreditar no êxito do acordo. Aliás, o presidente do Sinprof identifica “muitos ganhos” decorrentes da “pressão” deste organismo, exemplificando com a aprovação do novo Estatuto dos Agentes da Educação e os benefícios daí resultantes, como é o melhoramento da estrutura indiciária para os técnicos médios, que poderão ter, logo à entrada, um salário de até 103 mil kwanzas. Tal como os outros líderes sindicais, o presidente do Sinprof entende que, na actualização, as regras de transição não se devem focar apenas no nível académico, mas também no tempo de serviço dos professores que tenham obtido parecer positivo na avaliação de desempenho.

Sobre as notícias de que a organização que dirige estaria a planear uma suposta greve para comprometer o fim do ano lectivo, Guilherme Silva nega tudo, esclarecendo que o Sinprof tem ouvido os professores em assembleias para tomar uma posição em conselho nacional, uma reunião a decorrer entre 10 e 12 deste mês, em Benguela, com a participação de todos os secretários províncias. Após o encontro, o Sinprof deverá anunciar a medida adoptada. “A decisão de greve ou não cabe ao conselho nacional, que, de acordo com os nossos estatutos, é o órgão que deverá deliberar, ponderar e decidir o rumo a seguir depois de esgrimidos todos os argumentos necessários face ao momento actual.”

MED não teme greve

Após a reunião, os três sindicatos dos professores remeteram para as bases a decisão a tomar, em função da proposta do Governo. O Sinprof, por exemplo, não descarta a possibilidade de greve, dependendo das deliberações que sairão do conselho nacional a decorrer em Benguela, de 10 a 12 deste mês. No entanto, Isaac Paxe, coordenador da comissão de concertação do MED nas negociações com os sindicalistas, reage da seguinte forma: “Existe uma Lei da Greve, pelo que todos os actos devem ser feitos dentro da lei”, diz Paxe, antes de sublinhar que, se os sindicalistas pretendem exercer um direito, “devem fazê-lo com responsabilidade”.  

 

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