Crianças excluídas e vítimas de preconceitos

Autismo continua a ser ignorado

O autismo afecta, pelo menos, uma em cada 60 crianças no mundo. Em Angola, não há estatísticas, mas continua a ser ignorado e visto como tabu. A 2 de Abril, assinala-se o Dia Mundial da Consciencialização sobre o Autismo.

Autismo continua a ser ignorado
Santos Sumuesseca
O Coração Azul, ATL especializado para crinanças
Maria da Luz

Maria da Luz responsável do Coração Azul

“A psiquiatria não é o lugar para os autistas. Eles precisam de um centro de neuro-desenvolvimento”,

Assinalou-se na passada terça-feira, 2 de Abril, o Dia Mundial da Consciencialização sobre o Autismo, doença que afecta, pelo menos, uma em cada 60 crianças no mundo. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que haja cerca de 70 milhões de pessoas com a doença em todo o mundo.

Em Angola, as autoridades desconhecem a abrangência da doença que é carregada de tabus, preconceitos e quase desconhecida. Actualmente, existem, no país, quatro associações que lutam para a consciencialização da doença. Uma delas é o Coração Azul, que, desde 2016, tem um ATL especializado para crianças e adultos com autismo. O centro tem a missão de ajudar a sociedade a conhecer o autismo, desmistificar crenças erradas sobre a doença, contribuir para o desenvolvimento pessoal e social dos indivíduos afectados pelo autismo, através de actividades ludo-terapêuticas e a promoção de ventos que visam apoiar famílias e cuidadores, em particular mães.

Segundo a responsável do centro, Maria da Luz, “embora de forma tímida, a sociedade já começa a ter sensibilidade e consciencialização sobre o autismo”. Mas, por outro lado, continua a não haver inclusão das pessoas com esta condição. “As escolas continuam a não incluir os meninos com autismo porque a crise faz com que não se invista nos professores e técnicos auxiliares para o ensino especial”, lamenta. “Estes meninos, quer autistas, quer com necessidades especiais, precisam ir à escola, mas não são aceites porque não há condições humanas, físicas e técnicas”, acrescenta ao explicar que a situação se estende à saúde. “Não temos ainda um centro do diagnóstico ou de acompanhamento de neuro-desenvolvimento.”

Angola dispõe apenas de dois hospitais públicos com capacidade técnica e profissional para detectar, em consultas de desenvolvimento, crianças com problemas: os hospitais ‘David Bernardino’ e Psiquiátrico de Luanda. “A psiquiatria não é o lugar para os autistas. Eles precisam de um centro de neuro-desenvolvimento”, defende Maria da Luz

A falta de infra-estruturas pressupõe a falta de especialistas, que também não há no país. Razão pela qual, muitos doentes acabam por não ter consultas de desenvolvimento adequadas, o que dificulta o diagnóstico precoce.

Ainda quase desconhecido, o autismo é visto como um tabu. Em Angola, muitos vivem com a deficiência. A falta de diagnóstico e o estigma são as maiores dificuldades. Muitas pessoas são rotuladas de feiticeiras ou ‘sereias’ e, algumas vezes, acabam espancadas por familiares ou vizinhos.

 

Inclusão tecnológica

Para este ano, a ONU definiu como tema central ‘Tecnologias assistivas, participação activa’. “Para muitas pessoas no espectro do autismo, o acesso a tecnologias assistenciais a preços acessíveis é um pré-requisito para poder exercer os seus direitos humanos básicos e participar plenamente da vida de suas comunidades e, assim, contribuir para a realização dos objetivos de desenvolvimento sustentável. A tecnologia assistiva pode reduzir ou eliminar as barreiras à sua participação em igualdade com as demais”, argumenta a instituição.

O autismo é um transtorno global de desenvolvimento infantil, geralmente diagnosticado entre os dois e três anos, que é caracterizado por problemas na comunicação, socialização e comportamento. A doença faz com a criança apresente algumas características específicas, como a dificuldade na fala e em expressar ideias e sentimentos, mal-estar no meio de outros e pouco contacto visual, além de padrões repetitivos e movimentos estereotipados, como ficar muito tempo sentado balançando o corpo para frente e para trás.

 

Monumentos de azul

A 2 de Abril, assinala-se o Dia Mundial da Conscientização sobre o Autismo, data instituída pela Organização das Nações Unidas (ONU). Pelo mundo, alguns dos monumentos mais importantes, como o Cristo Redentor, no Rio de Janeiro, no Brasil; a Estátua da Liberdade, em Nova Iorque, nos EUA; a Torre Eiffel, em Paris, e tantos outros, iluminam-se de azul para alertar sobre a condição que afecta mais de 70 milhões de pessoas em todo o mundo. No ano passado, em Angola, pela primeira vez, um grande monumento ‘abraçou’ a causa: o Memorial Dr. António Agostinho Neto, onde se encontram os restos mortais do primeiro Presidente de Angola e que é um ‘ex-libris’ da capital. Todo o monumento foi iluminado de azul por iniciativa do projecto ‘Coração Azul’. Neste ano, o local escolhido foi o Largo da Independência, com a estátua de Agostinho Neto a ‘vestir-se’ de azul.

O governador provincial defende que a parceria entre a sociedade e o Estado, no acompanhamento do autismo, deve ser permanente. Sérgio Luther Rescova garante que, mesmo com limitações, não vai cruzar os braços. Luther Rescova defende currículos escolares específicos e que os professores sejam capacitados. Para as famílias, o governante apelou à auto-estima das pessoas com autismo, entre adultos e crianças. “As famílias devem aceitar a situação de um membro com autismo e pedir ajuda para que a criança tenha maior atenção e aceitação dentro das comunidades”, acrescentou.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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