Num centro comercial nos Congolenses, em Luanda

Invasão por um emprego

Invasão por um emprego
Manuel Tomás

Mal foi retirada a cobertura das obras do ‘shopping’ Cine Ngola, nos Congolenses, em Luanda, centenas de jovens procuram no local, todos os dias, um emprego. Na passada segunda-feira, houve uma autêntica invasão, com centenas de jovens a tentar entregar currículos. Um deles, Filipe Kinanga, de 27 anos, apercebeu-se através de um grupo nas redes sociais que havia emprego e deslocou-se até aos Congolenses. Sem se preocupar para o qual queria candidatar-se, tentou apenas entregar os documentos. Mas sem sucesso. O jovem técnico médio de Contabilidade e Gestão, decepcionado, assegura que vai continuar a tentar.

Segundo Paulo Mateus, responsável pela construção do centro e um dos representantes da empresa Cojimbo, proprietária do empreendimento, o recrutamento nem estava previsto para segunda-feira. “Fomos forçados a começar o recrutamento mais cedo por causa da enchente no portão”, explica, ao referir-se ao grande número de jovens com currículos que passaram o dia em frente às instalações, alguns chegando mesmo a pernoitar. “Seria desumano não receber os documentos”, acrescenta o responsável.

O centro tem apenas disponíveis 30 vagas para balconista, motorista, empregadas domésticas e  operadores de máquinas. Até às 13 horas, já tinham sido entregues mais de 500 currículos. “Tivemos que parar. Já não há espaço. Já temos 520 documentos”, revelava aquele responsável.

Quem também entrou no ‘empurra-empurra’ foi Luís Almeida, um aposentado de 74 anos. Acordou logo cedo e foi à luta à procura de um lugar para o filho de 29 anos. “Infelizmente, não consegui”, lamentava-se. Mesmo tendo chegado às 5 horas, não teve sucesso.

Outro candidato, Arménio Fernandes, durante vários dias com os documentos nas mãos, ia todos os dias ao ‘shopping’. Mas ,no dia da entrega, não teve sorte. “Está super cheio desde as 5 horas. Estavam a receber documentos só para pessoas conhecidas”, queixava-se. O jovem de 24 anos queria um emprego como operador de logística.

Entre gritos de frustração e descontentamento, soava uma voz feminina que se recusou a identificar-se. “A pessoa quer trabalhar, mas não há emprego. Depois dizem que querem acabar com a prostituição e com o desemprego”, exclama. Houve quem, depois de várias tentativas, se ficou pelo choro: “Isso é muita humilhação. A pessoa corre atrás, mas nunca consegue”, lamentava a jovem.

Eram tantos os candidatos que nem a viatura de um dos responsáveis ‘shopping’ escapou ao cerco. Vários jovens com currículos nas mãos fizeram uma barreira para impedir a passagem, pedindo boa vontade para receber os currículos. O responsável parou a viatura e foi logo invadido com uma chuva de currículos que até fez questão de receber. Mas, segundos depois, já dentro do quintal do estabelecimento, fez questão, mesmo à frente dos candidatos, de os deitar no chão. Uma atitude que causou a revolta dos jovens que nada puderam fazer a não ser lamentar. Logo de seguida entrou para o estabelecimento e não mais foi visto.

Recentemente, o Instituto Nacional de Estatística (INE) mostrou um estudo do Inquérito de Indicadores Múltiplos de Saúde (IIMS) 2015-2016, em que apontava que 67 por cento da população angolana não procurava emprego.

O centro comercial tem a inauguração prevista para Setembro.

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