Agora pergunto eu...

Na semana em que entre nós todas as perguntas giram em torno do congresso do MPLA, do legado agridoce de José Eduardo dos Santos, mas também da necessidade do novo PR de lhe seguir os passos tornando-se também ‘número um’ do partido e à volta dos variados resultados perversos que já sabemos ter um governo em que partido e Estado não se distinguem, o ‘Valor Económico’ publicou uma formidável entrevista a não perder.

Aconteceu muito mais esta semana pelo mundo fora, claro. Rodrigo Duterte, em mais uma das suas ‘pérolas’, relacionou as violações na sua terra natal com a beleza das mulheres (a capacidade incansável da estupidez de subir de tom nunca deixa de surpreender, não basta justificações energúmenas como a roupa provocadora, por exemplo, tinha que haver mais justificações idiotas por aí). Donald ‘Proteccionismo’ Trump excluiu o vizinho Canadá dos novos acordos comerciais e a ONU aliou-se à comunista China na luta contra o proteccionismo, quem diria? O Brasil conseguiu demonstrar ao mundo, mais uma vez, que o conceito de democracia é utópico, que o que existe é um sistema que se move consoante a música dos poderes instalados e que a vontade do povo é perfeitamente ignorável quando grita coisas que não interessam ouvir. É que Lula, culpado ou não de ter recebido o apartamento que não estava no nome dele, indo a eleições, ganha sem qualquer concorrência porque tem o claro apoio popular e foi impedido de concorrer por uma minoria que responde a poderes maiores. Além de perder o livre arbítrio popular na semana passada, nesta, um incêndio consumiu o seu maior museu (o maior da América Latina, por sinal), tornando 200 anos de História em cinzas irrecuperáveis. Aqui mais perto, o sul-africano Julius Malema (que continua em bolandas com a polémica dos guarda-costas brancos que já levou a sugestões de que, sendo tão defensor dos direitos dos africanos que frequentemente anda ali na fronteira com o franco racismo, não confia neles para o defender) sugeriu uma África unida sob a liderança de um só presidente.

A avaliar pelo que acontece aos africanos quando têm poder a mais, havia de ser uma coisa bonita. A História está demasiado cheia de exemplos em que o poder corrompeu os melhores líderes, as melhores promessas, os maiores ideais e as mais puras intenções.

E, como não podia deixar de ser, não falta quem se aproveite dessa capacidade corruptora do poder. E é este, entre outros, o alerta do entrevistado desta semana no especialista de economia ‘Valor Económico’, enquanto o poder corrompe, não falta quem se aproveite.

Se não teve acesso a uma cópia do jornal, veja online em valoreconomico.co.ao, querido leitor, porque vale a pena quanto mais não seja para compreender a perspectiva de um ‘insider’ da indústria que alimenta e simultaneamente mantém refém a economia nacional.

António Vieira é um veterano do sector petrolífero. O ex-director-geral da Roc Oil e da Cobalt faz afirmações inequívocas e claras com uma ausência rara de jargão cujo intuito é fazer-se perceber pelo mais leigo na matéria e sobretudo com um conhecimento de causa inquestionável. Começa por se mostrar céptico quanto ao que todos, de forma genérica, celebram como um passo fundamental no sentido da transparência (com a excepção provável do PCA da Sonangol que viu o seu poder reduzido súbita e irremediavelmente), que é a retirada do poder de concessionária à petrolífera nacional. Consubstancia o seu cepticismo com o facto de as pessoas disponíveis para integrarem o novo organismo serem as mesmas e, por isso, com os mesmos vícios e com a mesma dificuldade de lutar contra o sistema corrompido que sempre os beneficiou. Explica que o Executivo não tem sabido defender os interesses nacionais nas negociações com as poderosas petrolíferas internacionais e afirma que o actual sistema de contratos de partilha de produção significa que, na prática, não apenas dividimos perdas com as petrolíferas, como pagamos para que venham cá investir. “Se a multinacional investir um milhão de dólares, ao recuperar o investimento, recupera este valor mais o uplift, que varia entre 30 e 40 por cento”. É perturbador. Pergunto-me como será possível ao Presidente mudar estas, que são verdadeiras máculas de fundo, verdadeiras âncoras que prendem o desenvolvimento económico de Angola. Já começou com o pé esquerdo com “o primeiro encontro que foi realizado muito cedo propositadamente por pressão das petrolíferas (...) que enganaram o Executivo e driblaram o chefe (...) fizeram-se cedências que não deveriam ter sido feitas”. No entanto, lembrando que JLo tem a capacidade de surpreender (e mantendo a esperança), e agora pergunto eu: será capaz de fazer frente a estes poderosos interesses instalados?