Segundo algumas editoras

Política do livro provoca “concorrência desleal”

Editoras desejam que os escritores sejam legalmente obrigados a abdicar da edição e impressão das próprias obras. Instituto Nacional das Indústrias Culturais assegura que o mercado não precisa de mais regulamentação.

Política do livro provoca “concorrência desleal”

Uma obra deve ser observada e discutida por um conselho editorial capaz de olhar para o texto e compreender se tem ou não chances de sucesso.

Algumas editoras querem influenciar as autoridades para alterar o regime regulatório do livro, visando a proibição de edição de obras por parte de escritores e correctores independentes. No entender das empresas, a política nacional do livro e a promoção da leitura e a lei sobre os direitos do autor e conexos, propiciam “concorrência desleal”.

Os operadores justificam-se com os custos que acarretam com água, luz eléctrica, impostos e pessoal, sendo que os editores independentes retêm o prémio sem ter de pagar nada ao Estado. Para a publicação de uma obra, sem a chancela de uma editora, o autor tem apenas custos com a produção e beneficia gratuitamente de um número de depósito legal, concedido pela Biblioteca Nacional. Mas a obra jamais poderá ser distribuída fora de Angola, porque a Agência Portuguesa de Editores e Livreiros, órgão responsável pela atribuição do Número de Livro Padrão Internacional – ISBN às obras lusófonas, só atribui o código às editoras associadas.

João Correia entende que o ISBN “não é muito importante para a natureza de alguns livros”. O professor de língua portuguesa, por enquanto se recusa a criar uma empresa, compreende que as obras ligadas à política doméstica e desenhos animados não precisem de ter credencial internacional.  João Correia regista dois a três pedidos por ano e considera “absurda” a ideia de se proibir escritores de editarem ou de acorrerem a profissionais independentes. 

André Mateus, também professor de português, que já desempenhou funções de revisor em diferentes jornais, assegura ser “bastante procurado”, mas que nos últimos dias tem recusado, por motivos de agenda. Para editar uma obra, cobra 700 kwanzas por página de estrutura simples e 1.500 kwanzas por estrutura profunda. A definição de preços tem que ver com a qualidade dos textos.

Sandro Feijó, director-geral da Viana Editora, é dos que dá a cara na luta contra os editores independentes. Considera que as companhias se encontram em “estagnação” e aponta a edição independente e a onerosa impressão como responsáveis por isso. O director da Viana Editora, que defende uma alteração do regime regulatório, aconselha os escritores a abdicar da edição das próprias obras ou de procurarem editores independentes, por alegado risco de não tornarem a obra atractiva. Para Sandro Feijó, a edição não pressupõe apenas a revisão, paginação ou criação artística de capa. “A obra deve ser observada e discutida por um conselho editorial capaz de olhar para o texto e compreender se tem ou não chances de sucesso”. Para edição de uma obra, a Viana Editora cobra de acordo com a temática e conteúdo, mas, caso o texto lhe suscite interesse, opta por custear todas as despesas, recorrendo a patrocinadores. E retém 60% das vendas.

Em posição contrária, está a Editora Dois03, com presença em Brasília e Luanda. Sérgio Ventura, editor em Angola, embora compreenda que, sem observação profissional, a obra “perde muito na qualidade e acaba por ter uma distribuição deficitária”, sublinha que o autor “ganha muito mais” com a edição independente. Quando as editoras se responsabilizam pelos custos, ao autor é entregue apenas entre 5 e 10% do valor de capa. Mas a Editora Dois03, por exemplo, cobra 400 mil kwanzas por edição e atribui 60% do valor caso o autor consiga um patrocinador.

 

INIC rejeita

Michel Kanianga, director-geral-adjunto do Instituto Nacional das Indústrias Culturais (INIC), recusa-se a aceitar que haja concorrência entre editoras e escritores e responsabiliza as empresas pelos autores optarem por editar de modo independente. Defende que “não é tarefa do escritor editar a própria obra, mas, se o faz, é porque as editoras inverteram os valores, tornando-se prestadoras de serviço”. Na perspectiva de Michel Kanianga, a existência de editoras é cultural, “daí que não devem cobrar ao autor, como o têm feito”. O director-adjunto do INIC afirma perceber que as editoras “engajam muitas despesas”, com a revisão, capa, produção gráfica e distribuição, mas critica o facto de haver operadoras que “se recusam” a editar textos de autores desconhecidos, por “presumirem” que não serão rentáveis.

Para formalizar uma editora, deve-se constituir uma empresa no Guiché Único de Empresas e atribuir esse sector aos estatutos e, de seguida, solicitar um alvará.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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