Droga, burlas e falsificação de documentos são os crimes mais comuns

Mais de 800 estrangeiros nas cadeias de Angola

Mais de 800 estrangeiros estão presos, condenados por vários crimes. A lista é liderada por congoleses da RDC, mas também há brasileiros e europeus. Há quem se confesse culpado e explica porquê ao NG. Mas também há quem jure inocência.

Mais de 800 estrangeiros nas cadeias de Angola
D.R.
Entre os reclusos, os homens são em maior número.
Menezes Kassoma

Menezes KassomaPorta-voz do Serviço Penitenciário

De acordo com o Serviço Penitenciário, muitos estrangeiros, envolvidos em crimes, têm sido extraditados para os seus países, com base nos acordos com Angola.

As prisões angolanas abrigam 859 reclusos estrangeiros, entre detidos e condenados. Ao todo, 406 estão detidos preventivamente e 453 já foram condenados, acusados de crimes contra a propriedade e a perturbação da ordem pública, dos quais se destacam a falsificação de documentos, a burla e o tráfico de drogas. Entre os reclusos, os homens são em maior número e há apenas 71 mulheres.

O Congo Democrático, com 342 presos, lidera a lista, em que estão inscritos outros detidos provenientes da Namíbia, com 22; Nigéria, com 11; África do Sul, com nove; Congo Brazzaville, com oito; China, com sete; Vietname e Brasil com seis cada um. Mas há mais nacionalidades.

Entre os presos está ‘Daniela’ (nome fictício), de 49 anos, que foi candidata à vereadora do Rio de Janeiro, no Brasil. Como necessitava de dinheiro para a campanha, vendeu a casa. Mas não foi suficiente e recorreu a dívidas, incluindo com um jovem sul-africano. Mesmo assim, perdeu. Passados quatro meses, o sul-africano, a quem ela devia 2.500 reais (à volta de 650 mil kwanzas), começou a exigir os valores com “ameaças” de cobrar juros. Dias depois, ‘Daniela’ conseguiu metade do dinheiro. Quando foi pagar, o sul-africano recusou receber em parcelas. Propôs-lhe então que fosse até Joanesburgo, África do Sul, num voo que passaria em Angola, a começar em São Paulo e que transportasse uma mala. ‘Daniela’ sabia que continha droga, só desconhecia a quantidade.

No aeroporto de Guarulhos, ainda pensou em devolver a mala, mas, por “medo de ser morta, porque neste aeroporto eles têm muitos contactos, subi no avião”, conta. Já em Angola, na primeira revista, não foi encontrada a droga, porque a mala já tinha sido despachada, mas, “por medo”, afirma ela, avisou a polícia e mostrou a mala.

Confirmada a droga, foi levada para uma das celas e depois encaminhada ao tribunal. Foi sentenciada a oito anos de cadeia, tendo já cumprido dois e está na lista para a transferência para o Brasil. Se a droga chegasse à África do Sul, iria receber 13 mil reais. Segundo ela, o dinheiro ajudaria a “melhorar a vida e ter estabilidade financeira”. “Ter a certeza da deportação para mim é uma grande vitória, tenho saudades da minha filha e do meu neto”.

Outra brasileira, condenada pelo mesmo motivo, é ‘Mariana’ (nome fictício), de 29 anos, antiga funcionária do Banco Central Brasileiro. Depois de ter ficado desempregada, recebeu uma proposta para ganhar 10 mil reais por parte de um angolano, residente em São Paulo. A jovem viu na oportunidade a forma “justa” de sustentar a sua filha de sete anos. Aceitou trazer droga para Angola, que seria entregue a um outro angolano, que estaria à sua espera no aeroporto em Luanda. Arrependida, confessa que foi a primeira vez que se envolveu no tráfico de drogas. Foi condenada a quatro anos de prisão.

A polícia não encontrou os outros cúmplices do negócio, sobretudo os que seriam receptores da mercadoria em Luanda. ‘Mariana’ jura ter dado todas as coordenadas para a localização do suposto receptor. Lembra-se que conheceu o angolano no Brasil, por intermédio de uma amiga, cujo nome não quis revelar, que está neste “negócio há bastante tempo”. “As dificuldades que enfrentei durante três anos, depois de ser desempregada, não tinha como criar o meu filho”, lamenta.

De acordo com esta reclusa, a droga não era destinada a Angola, mas à Namíbia. Mesmo sentindo “medo”, as palavras da amiga e as necessidades “falaram mais alto”. Transportou a droga dentro do cabelo. Agora, aguarda a extradição para o Brasil para cumprir o que resta da pena.

O espanhol ‘José’ (nome fictício), 52 anos, também foi apanhado com drogas e condenado a oito anos. Vinha do Brasil com destino à Europa. Foi a crise que o fez desempregado. Em Espanha, alguém o convenceu a entrar no tráfico para mudar de vida. Patrocinou a viagem até ao Brasil. ‘José’ nunca soube quantos quilos levava. Por viagem, ganhava quatro mil euros. Nas outras duas viagens que realizou, não teve problemas nem participou directamente na venda. Também está à espera da deportação para a Espanha. Garante receber visitas de funcionários da embaixada de Espanha, uma vez em cada três meses.

Acordos de extradição

Mais de 800 estrangeiros nas cadeias de Angola

(Entre os presos está uma brasileira de 49 anos, que foi candidata à vereadora do Rio de Janeiro)

Diferente das brasileiras e do espanhol, ‘Pascal’ (nome fictício), 58 anos, está detido por crime de abuso de confiança. Chegou a Angola, vindo de França, com a intenção de criar uma empresa de exploração e venda de diamantes. Estabeleceu uma sociedade com um português e um angolano que o acusaram de desviar dinheiro. Mas o francês jura inocência e tem esperança de sair da cadeia, em breve. O tribunal deu-lhe razão.

De acordo com o Serviço Penitenciário, muitos estrangeiros, envolvidos em crimes, têm sido extraditados para os seus países, com base nos acordos com Angola. O porta-voz do Serviço Penitenciário, Menezes Kassoma, reafirma que alguns angolanos que também se envolvem em crimes no estrangeiro têm sido extraditados para cumprir penas. Por exemplo, 35 angolanos que se encontravam no ‘corredor da morte’, na Zâmbia, tiveram de vir cumprir as penas em Angola. Alguns, de acordo com a legislação angolana, viram as penas reduzidas e outros foram postos em liberdade”, com base no indulto concedido pelo então Presidente da República, José Eduardo dos Santos, durante a celebração dos 40 anos de independência nacional.

Segundo Menezes Kassoma, o acordo da ‘troca de presos’ entre Angola e outros países tem sido cumprido desde que “haja solicitação” entre as partes, estando, neste momento, em curso o processo da extradição de duas brasileiras detidas na cadeia de Viana.

O acordo de extradição de presos entre Angola e Brasil foi assinado em Agosto de 2009. Segundo o documento, além da extradição, está prevista também a assistência e repatriamento mútuo. O mesmo acontece com Portugal e outros países africanos.

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