Angola tem 1.111 igrejas cristãs legalizadas

Muçulmanos procuram reconhecimento

Há 1.111 igrejas cristãs legalizadas e 827 aguardam pela legalização. Um estudo da Assembleia Nacional conclui que, em Luanda, por cada quarteirão, existem cinco igrejas. Há ainda 62 mesquitas, construídas de forma clandestina, porque Angola não reconhece a religião muçulmana. O Conselho de Ministros previa revogar a lei sobre a Liberdade Religiosa esta semana.

Muçulmanos procuram reconhecimento
Mário Mujetes

No mundo, existem, segundo dados do centro norte-americano de pesquisa ‘Pew’, 1,6 mil milhões de muçulmanos. Angola ainda não reconhece oficialmente a religião. No entanto, estima-se que haja mais de 900 mil crentes, que frequentam diariamente 62 mesquitas. Só Luanda tem 28 mesquitas de uma religião que está em crescimento no país.

De acordo com a história da religião em Angola, os primeiros crentes do Islão chegaram ao país apenas em 1978, ou seja, depois da independência. No entanto, no tempo colonial, havia muitos crentes islâmicos, imigrantes, vindos do Paquistão ou de Moçambique.

Angola aprovou uma lei, sobre o Exercício da Liberdade de Consciência, de Culto e de Religião, em 2004. O representante da comunidade muçulmana, David Alberto Já, considera-a “ambígua por coartar a liberdade religiosa e é um atentado contra os direitos fundamentais”.

“Em 14 anos de vigência, “nenhuma igreja foi reconhecida, portanto, a lei viola direitos humanos”, conclui David Alberto Já.

A lei exige que, para se reconhecer uma igreja, esta tenha, pelo menos, 100 mil fiéis. Uma exigência contestada pelo líder religioso, que a considera “absurda e excessiva” e faz uma comparação: “para se fundar um partido, são exigidos cinco mil militantes, e os partidos é que criam caos e guerras e violam todas as liberdades fundamentais”. David Alberto Já reprova o rótulo que associa a religião ao terrorismo. “Os muçulmanos são pacíficos”, argumenta, justificando com “problemas meramente políticos” os atentados. Recorda ainda que, nos EUA, Inglaterra e França, “nunca fecharam as mesquitas ou proibiram o Islão”, porque sabem separar o terrorismo do Islão.

O responsável defende que a religião, por ser secular, “não precisava de reconhecimento” e que faz parte das três grandes religiões mundiais, a par do judaísmo e do cristianismo. “Angola é o único país do mundo que não reconhece o islão”, lamenta.

As 62 mesquitas foram construídas à “revelia, já que foi difícil conseguir os terrenos e legalizar as obras”, admite David Já. Para as erguer, tiveram de fintar a lei com outros argumentos, como “é lícita e facultativa a reunião de pessoas para a prática do culto ou outros fins específicos da vida religiosa”. A lei institui que “não carecem de autorização oficial nem de participação às autoridades competentes, as reuniões promovidas por confissões religiosas”, desde que se realizem dentro de templos ou em locais apropriados, mas só se aplica aos cristãos.

Os responsáveis da comunidade muçulmana enviaram solicitações ao Governo, pedindo o reconhecimento ou, pelo menos, explicações. Nunca obteve respostas dos departamentos que lidam com as questões religiosas. Mesmo quando querem legalizar terrenos, as administrações municipais também evitam dar respostas ou explicações.

Depois de 14 anos

O Conselho de Ministros pretendia aprovar, esta semana, a nova Lei sobre o Exercício da Liberdade de Consciência, de Culto e de Religião (Lei nº 2/04), que estabelece, de forma inequívoca, o exercício de culto por parte de fiéis e confissões religiosas.

Em 2017, a Assembleia Nacional solicitou ao Governo a revisão da lei para “melhor se adequar à realidade” do país e resolver a questão das denominações religiosas, lia-se no comunicado da 6.ª Comissão de Trabalho Especializado da Assembleia Nacional (AN).

Segundo o relatório, apresentado durante o debate mensal sobre ‘Laicidade do Estado, a Liberdade Religiosa e o Respeito pela Lei e os Direitos Fundamentais em Angola’, é necessário que o Estado faça a supervisão dos locais de culto. O mesmo documento aponta para a existência, em Angola, de 1.111 igrejas “legalmente” reconhecidas, todas cristãs, e outras 827 que ainda aguardam o reconhecimento, a maioria em Luanda, com 721.

O relatório estima ainda que, por cada quarteirão de Luanda, haja cinco igrejas.

 Católico pede estudo e diálogo

António Custódio, padre católico, no seu livro ‘Um Olhar à Presença dos Muçulmanos em Angola’, faz uma análise da religião e da forma como o Governo se deve preparar para responder ao seu crescimento. António Custódio defende a necessidade de se “estudar mais as religiões, dialogar, conhecer o Islão e não o temer” e atribui igualmente responsabilidades à comunidade muçulmana, a quem “cabe também mudar a visão que os outros têm dela”.

No livro, o clérigo católico destaca que a comunidade “ainda é pequena”, mas prevê que possa “crescer naturalmente” e, por isso, “é preciso estar preparado para as exigências do Islão”, no que concerne à implementação de projectos sociais, como a construção de escolas próprias, ao uso do véu, ao atendimento médico exclusivamente feminino, entre outras. O estudioso explica que os muçulmanos em Angola são maioritariamente do Oeste de África, com algumas cifras do Médio Oriente e de outras nacionalidades que procuram viver “religiosamente” junto da comunidade islâmica, “apesar de algumas tensões desestabilizadoras da unidade no seio da mesma devido a problemas de poder, de liderança, de interesses materiais, de objectivos diversificados segundo as organizações em que uns não concordam com os outros”, lê-se na introdução do livro.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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