O Caos!

Só podia ser sabotagem de gente especializada, pois, numa manhã que
tinha tudo para ser como todas as outras, o país acordou sem telefone

nem internet. A tese de que se tratava de uma falha propositada reforçou-
se quando se notou que as televisões por satélite continuavam a emitir

normalmente, mas a net e os fones continuavam sem bumbar, mesmo
para os clientes que tivessem pago estes três serviços [telefonia, televisão
e internet] duma só vez, numa só operadora, tendo o mesmo prazo de
validade.
Com efeito, o Governo reuniu-se de emergência, convocando
engenheiros de diversas especialidades, kimbandas e pastores, bem
como aqueles jovens congoleses que costumam reparar telefones.
Entretanto, enquanto os muatas tentavam descobrir as causas do apagão
cibernético e telefónico, a população xixilava e desesperava-se. Por
exemplo, a empregada doméstica lamentava por ter gastado o dinheiro do
táxi à toa, saindo de casa (no Zango) para a casa do patrão (na Maianga),
quando lhe bastava ter o telefone operacional para ler a mensagem do
boss, tia fulana, não precisas de aparecer hoje, a casa está em obra.
Outros que também sentiram os constrangimentos de ficar sem fone
nem net eram os jornalistas, que ficavam horas e horas à espera da fonte,
no restaurante ou bar em que haviam combinado o encontro, para no final
perceberem que o entrevistado afinal havia viajado no dia anterior,
obrigando-os a desenrascar uma chouriçada para fechar o jornal. Os
poucos que suportavam avontademente a crise eram os bombeiros, os
agentes da polícia e os serviços de ambulância, que aproveitavam, assim,
para descansar, visto que, nos dias normais, estão sempre disponíveis
para desempenhar a importante missão de salvar o povo.
O país estava, portanto, parado, com dias seguidos de
imbumbabilidade, quando o Governo, depois de dias de intensa discussão,
aprovou por unanimidade o plano de investir na importação de capim seco
para facilitar a comunicação. Visando evitar que, na queima de capim, o
fumo do empresário se confundisse com o pedreiro e o do taxista não se
confundisse com o do jornalistas ou marceneiro, os competentes muatas
desembolsaram milhões de kwanzas para aquisição de corantes,
sugerindo que estes produtos fossem despejados sobre o capim, antes de
se atear o fogo que produziria um fumo correspondente à profissão ou

nível social do emissor. A tuberculose, as infecções pulmonares e
bronquites que se seguiram foram tão impactantes que, mal soltei uma
tossidela, me descobri suado e assustado na cama lá de casa. Era apenas
um sonho absurdo, tranquilizei-me.

Outros artigos do autor