Temem mais desemprego e encerramento de estabelecimentos

Novo salário mínimo preocupa comerciantes

O Governo prevê a entrada em vigor do novo salário mínimo nacional em Agosto. Pequenos investidores temem que o novo diploma possa produzir mais desemprego.

Novo salário mínimo preocupa comerciantes
Santos Sumuesseca

O problema são os fiscais. A lei diz uma coisa, mas como não entendemos quase nada sobre leis, aproveitam-se para nos extorquírem

Salário mínimo nacional foi actualizado há quatro meses, mas os líderes dos pequenos estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços não estão satisfeitos e consideram que seria melhor aguardar “pelo passar da crise”. Na perspectiva dos patrões, “boa parte dos estabelecimentos não terão capacidade” para cumprir com as novas regras, aprovadas pelo Conselho de Ministros, face à conjuntura económica.

O Governo prevê passar a responsabilizar as empresas que não cumprirem com as novas normas, a partir de Agosto, segundo Leandro Cardoso, inspector do Ministério da Administração Pública, Trabalho e Segurança Social. O revoga o Decreto Presidencial nº 91/17 e determina um aumento salarial único na ordem dos 30%.

O documento permite aos estabelecimentos praticarem salários abaixo da taxa mínima, desde que comprovem “documentalmente a impossibilidade de efectuarem o pagamento dos valores fixados por lei, uma tarefa que deve ser autorizada pelo titular do departamento ministerial, responsável pelo sector do trabalho”, lê-se no decreto 89/19, assinado pelo Presidente da República.

Ainda assim, os comerciantes manifestam-se desconfortáveis, dado que o diploma não especifica um montante limite abaixo da taxa oficial que se possa praticar, em caso de incapacidade financeira. “O problema é os fiscais. A lei diz uma coisa, mas como não entendemos quase nada sobre leis, aproveitam-se para nos extorquirem”, lamenta Alfredo Sidney, gestor de um depósito de pão, ainda não formalizado.

A unidade possui dois colaboradores, que auferem salários de 12 mil kwanzas. “Estamos a começar. Só contratei essas pessoas porque tenho outra ocupação, senão eu mesmo ficava aqui. Aonde vou tirar 21 mil ou 26 mil para salários?”, questiona-se, apelando ao recuo da medida.

Ricardo Gomes, proprietário da Young Spirit, um estabelecimento de venda de cartões de saldos de TV por satélite e de chamadas, no Ngola Kiluanje, teve de despedir um dos dois colaboradores, face à incapacidade em continuar a honrar com pagamentos. Também apela a que o Governo recue na pretensão do aumento, sob pena de “muitas empresas virem-se forçadas a encerrar”. Paga 36 mil kwanzas ao único empregado, mas sublinha que o faz com atrasos, não só pela “pouca clientela” e despesas diárias, bem como pelo “aluguer do estabelecimento” de 39 mil kwanzas.

Até 2013, além de saldos e ‘box’ da Zap, Ricardo Gomes vendia telemóveis e assessórios telefónicos, mas reduziu o volume de negócios por causa da crise e teme que a situação piore. “A vida está difícil para todos. Por hoje, as pessoas só estão a comprar o saldo da Zap porque os filhos incomodam. Mas se vermos, na venda de 20 cartões, 15 são de cobertura de apenas sete dias, que vendemos a 750 kwanzas”, refere Ricardo Gomes, que paga de imposto 1% da renda mensal, além de 17 mil kwanzas anuais para a obtenção do recibo.

Fernando Ambrósio, gestor da padaria 123, de investidores chineses, também espera que o Governo reconsidere por causa da incapacidade financeira. Conhecedor do mercado, sublinha que boa parte das padarias “não têm condições” para proceder ao aumento exigido pelo diploma.“Por exemplo, a padaria 123 é nova. E há poucos meses pagava 26 mil kwanzas à maioria dos trabalhadores aumentou para 28 mil. Essa é a capacidade actual, mas há necessidade de mais pessoal, obviamente que não poderá pagar o mesmo salário”, assegura Fernando Gomes, que alerta o Governo pelo perigo que a medida poderá gerar na sociedade.

Já Estevão da Costa, 30 ano, dedica-se ao trabalho de recauchutagem no bairro São João. A operar na ilegalidade, dado que há muito não renova a licença, por alegadamente não “sentir os benefícios do imposto”, exerce a profissão há três anos e conta com um único colaborador a quem paga um subsídio de 15 mil kwanzas mensal. Acredita que se o Governo for rigoroso em fiscalizar quem “paga e quem não paga”, de acordo com a lei, o desemprego vai multiplicar-se.

 

 

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