Ekepa não é inglês

No centro de Angola, do litoral ao nascer do sol, há um aforismo bem
conhecido por todos os falantes da língua predominante, incluindo crianças
que já se terão atrasado em algum evento de onde teriam benefícios, que
reza: “O atrasado come ossos”.
Esperando por um anúncio televisivo, atrasei-me ao jantar colectivo.
- O spot pode passar nesse instante, enquanto faço a travessia, e não
terei como aplaudir ou reclamar – pensei, acabando por assistir ao
telejornal da televisão pública.
Tal fez-me chegar ao restaurante naqueles momentos em que o funji,
pirão por essas paragens, aguarda pelo atrasado sem o respectivo
conduto. Nem cabidela de galinha gentia, nem losaka, nem ramas de
batata, nem nada. Apenas uns nacos grelhados de “galinha com pai e
mãe”, umas batatas do reino esfatiadas fritas e salada que se estendiam
sem clientes. E eu que sou “funjívoro”?
- Mano, tem pirão, mas o conduto já não. Acabou. Posso pedir jantar “à
la carte”? – indaguei. Solícito ao jovem que se apresentava de humor
ainda aceitável no balcão de atendimento.
- Conduto acabou? Como assim? – retorquiu.
- É verdade. Gosto mesmo é de comer pirão e, mesmo que aceitasse
galinha do kaputu, que ainda tem grelhada, já não há molho – expus.
O jovem parou por alguns instantes a procurar por uma resposta.
- ‘Stá bem. Vou à cozinha ver o que se pode fazer.
Passaram-se trinta minutos sem resposta, até que voltei a chamá-lo.
- Então, o mano não me deu resposta...
- Sim mano, ainda me desculpa. É mesmo um bocado de atrapalhação.
A sala encheu. Assim mesmo que não mais importunei o mano, é resposta
afirmativa. Ainda aguarda só mais um bocado.
- Bocado vem da boca como punhado deriva de punho. Que de lá surja
algo.
Não tardou, chegou uma kafeko. Magra e linda, se não fosse aquele
cabelo emprestado, seria mesmo uma ‘amigável’ para filho ou sobrinho.
Num prato três restos de frango e, noutro, beringela.
- Jovem, você é mesmo do Huambo?
- Sim, senhor, nasci mesmo aqui no Santo Rosa.
- Sabe o que é ‘ekepa’?
- Não senhor. Não falo inglês! Até a vontade de reclamar dos ossos que
se estendiam famintos no prato me passou. Como alternativa ao desejável
conduto ausente, tive de os mastigar e aproveitar o molho, também
escasso, para empurrar o pirão garganta abaixo, afugentar o bicho e
esperar pelo matabicho do dia seguinte.

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