Angola tem mais de 117 mil antigos combatentes à espera de reintegração

Cortes orçamentais comprometem inserção de antigos militares

O orçamento destinado à reintegração de antigos militares é apenas cerca de quatro por cento do exigido. Eram precisos 39 mil milhões de kwansas, mas só estão disponíveis mil milhões. Por isso, mais de 117 mil militares, portadores de deficiência, viúvas e órfãos aguardam por uma ‘luz ao fundo do túnel’. O responsável do IRSEM acredita que, se tivesse toda a verba, em 2022, estariam todos integrados.

Cortes orçamentais comprometem inserção de antigos militares
Mário Mujetes
Dificilmente os ex-militares conseguem emprego.
Domingos André Tchikanha,

Domingos André Tchikanha, tenente-General e director do IRSEM.

Os responsáveis e donos de empresas deviam cumprir o estipulado na lei, no recrutamento de trabalhadores e dar prioridade aos ex-militares, deixando de depender da entrega material de trabalho.

Angola tem cadastrados 117.537 mil antigos militares sem estarem reintegrados na vida política, económica, social ou mesmo diversos projectos promovidos pelo Instituto de Reintegração Socioprofissional dos ex-Militares (IRSEM), instituição que tem inscritois 241 mil antigos militares, entre sargentos e oficiais. Para a reintegração destes antigos ‘homens do gatilho’, o IRSEM precisa de 39 mil milhões de kwanzas, mas, em 2018, recebeu apenas mil milhões, ou seja, 3,9 por cento do orçamento necessário.

O baixo orçamento obriga a que 117 mil pessoas, entre 80.537 antigos militares, 13 mil portadores de deficiência e 24 mil viúvas e órfãos de guerra não estejam reintegrados. O director do IRSEM, Domingos André Tchikanha, acredita que, caso a situação económica da instituição melhore, em 2022, todos os ex-militares já cadastrados, com base nos acordos de paz, serão reintegrados nos diversos projectos promovidos pela instituição. “Com dinheiro, é fácil a reintegração socioeconómica dos ex-militares”, remata.

Benguela, com mais de 17 mil, Huíla, com 12 mil, e Zaire, com 49 mil, são as que têm mais ex-militares por reintegrar. Apesar de a verba ser curta, Domingos André Tchikanha lembra que as administrações municipais estão “obrigadas” a destinar 70 por cento do dinheiro do Programa de Combate à Fome e à Pobreza, para a reintegração dos ex-militares.

Em anos anteriores, o IRSEM previa reintegrar 11 mil pessoas, entre ex-militares, portadores de deficiência e vulneráveis, mas apenas conseguiu enquadrar 1.004. Todo o militar, quando é desmobilizado, passa a ter direito a um subsídio mensal de 55 mil kwanzas e o IRSEM depois procura enquadrá-los em vários projectos de reintegração, em todas as províncias. “O orçamento que recebemos do Ministério das Finanças, através do OGE, é inferior e não conseguimos atingir os objectivos que definimos”, admite Domingos André Tchikanha, também ele militar, com a patente de tenente-general.

Domingos André Tchikanha defende que a reintegração socioprofissional dos ex-militares “deve constituir um compromisso de todos, sobretudo dos empresários”. “Os responsáveis e donos de empresas deviam cumprir o estipulado na lei, no recrutamento de trabalhadores e dar prioridade aos ex-militares, deixando de depender da entrega material de trabalho, mas também de os empregar”.

Outro aspecto apontado pelo responsável é a formação profissional e académica dos antigos militares, sendo maior parte deles analfabetos, vinda de aldeias mais recônditas, “sem formação académica ou profissional, tendo passado muitos anos da sua vida na frente dos combates, sem oportunidades para serem formados”. Por isso, o director do instituto defende que algumas empresas deviam promover formações”

Actualmente, com o surgimento das novas tecnologias e as exigências de um mercado de trabalho, “dificilmente” os ex-militares conseguem emprego, também muitos “estão ultrapassados” pela idade, em que já ultrapassaram a faixa etária dos 50 a 60 anos de idade. A idade é apontada por Domingos André Tchikanha como outro “impedimento” que os ex-militares enfrentam.

Apesar destes obstáculos, director do IRSEM reconhece que nem sempre os meios de apoio foram bem usados. Por exemplo, lamenta que muitos ex-militares tenham oferecido a familiares ou vendido vários materiais que receberam do instituto. “Nem todos os beneficiários têm feito tudo para que os seus projectos cresçam, isso também por falta de vocação do que fazem, escolhem apenas os ramos como forma de manter o sustento das suas famílias. Uns vendem os bois ou oferecem os produtos que lhes são entregues”, admite.

A seguir aos Acordos de Paz de 1991, foram desmobilizados cerca de 240 mil efectivos, 50 mil dos quais eram oficiais, que ficaram sob a responsabilidade do Estado-Maior General das Forças Armadas Angolanas, através da Caixa Social Das Forças Armadas Angolanas. Os sargentos e soldados são da responsabilidade do IRSEM. O instituto prepara-se para celebrar 24 anos. Foi criado para apoiar o Governo na reintegração dos desmobilizados com base nos acordos de paz, com destaque para os de Bicesse, em 1991, Lusaka, 1994 e os Memorandos de Entendimento do Luena e do Namibe, entre a FLEC e o Governo. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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