Manifestação em Kafunfu terá causado seis mortes

Continuam troca de acusações entre a PN e o Protetorado Lunda-Tchokwe

Activistas ligados ao movimento Protetorado Lunda-Tchokwe acusam as forças de defesa e segurança de terem disparado indiscriminadamente na manifestação na madrugada deste sábado.

Continuam troca de acusações entre a PN e o Protetorado Lunda-Tchokwe
D.R

Segundo a Polícia Nacional a manifestação transformou-se, entretanto, numa rebelião aramada praticada por cerca de 300 elementos do movimento Protetorado Lunda-Tchokwe.

Os activistas saíram as ruas para apelar o Governo que negoceie a autonomia da região, que é rica em diamantes com base num acordo do tempo colonial entre o povo Lunda-Tchokwe e o governo colonial português, que não foi tido em conta após a independência de Angola.

Uma manifestação que, segundo o movimento, procurava apenas exprimir a vontade dos participantes em ver “os problemas das suas comunidades resolvidos e lamentar a falta de humanismo, que deveria caracterizar os agentes da autoridade do Estado”.

Num comunicado divulgado na rede social Facebook, o movimento conta que, na terça-feira passada, recebeu uma denúncia sobre “o plano das autoridades competentes de inviabilizar a manifestação a 30 de Janeiro”.

Esse alegado plano incluiria, segundo o comunicado, “preparar catanas e machados, rasgar a bandeira da República e arranjar notas de kwanza falsas, com camisolas do Movimento em posse da Polícia do Kuango, que havia extraído em 2015, para aqueles que forem detidos serem acusados como provas do crime na manifestação”.

Terá sido criado, segundo se lê na nota, “mais um grupo de manifestantes afectos à JMPLA e outros meliantes”, os quais terão sido pagos para “criar vandalismo” a ser imputado aos activistas do protetorado português da Lunda-Tchokwe detidos no dia da manifestação.

O Movimento do Protetorado Português da Lunda Tchokwe exorta a comunidade nacional e internacional a levar em conta “o problema dos assassinados de Kafunfo” que “são de longa data, protagonizados na sua maior parte pelos agentes da ordem e pelos agentes de seguranças de empresas mineiras”.

Segundo a Polícia Nacional a manifestação transformou-se, entretanto, numa rebelião aramada praticada por cerca de 300 elementos do movimento Protetorado Lunda-Tchokwe.

De acordo com o comunicado do comando provincial da Lunda-Norte da Polícia Nacional, os manifestantes tinham armas de fogo do tipo AKM, caçadeiras, ferros, paus, armas brancas e pequenos engenhos explosivos artesanais. Ainda de acordo com a polícia nacional o confronto resultou na morte de seis pessoas.

Números contrários aos avançados pelo movimento Protetorado Lunda-Tchokwe que aponta para 15 o número de mortes e dez feridos.

Líderes da igreja católica alertam para “grave massacre”

Vários bispos católicos angolanos denunciaram hoje o que consideram ter sido um "grave massacre" de manifestantes na localidade de Kafunfo, Lunda-Norte, afectos ao Movimento do Protetorado Português da Lunda-Tchokwe

Nas redes sociais, vários bispos católicos que integram a Conferência Episcopal de Angola e São Tomé (CEAST) também condenaram as mortes dos manifestantes pela polícia.

O arcebispo de Saurimo, José Manuel Imbamba, que já foi o bispo da diocese onde se localiza Kafunfo, escreveu na rede social Facebook um “desabafo em voz alta”, lamentando o sangue “derramado inutilmente” e questionando se havia necessidade para “tanta violência e desumanidade”.

“Os problemas sociais, de miséria, exclusão e analfabetismo são mais do que evidentes nesta região leste. Em vez da política dos músculos, não seria mais sensato cultivarmos a política do diálogo para juntos resolvermos e venceríamos as assimetrias sociais gritantes tão notórias?” – questionou.

O também vice-presidente da CEAST e responsável pela província eclesiástica que tutela a diocese do Dundo diz estar “profundamente chocado e consternado” com o sucedido, espera que a investigação seja “vigorosa e responsabilize os que agiram mal”.

Já o bispo de Cabinda, Belmiro Chissengueti, na sua reação sobre o ‘massacre’ na Lunda-Norte, afirmou, na sua conta oficial no Facebook, que o que se passou em Kafunfo “é muito grave”, defendendo “investigações independentes para se responsabilizar publicamente os culpados”.

“Este país é grande demais e nele cabemos todos. É muito rico, mas é preciso que se deixe de roubar e se distribua a riqueza mediante a diversificação da economia geradora de empregos. Não podemos continuar neste paradoxo que faz das zonas de exploração de riqueza verdadeiros pântanos de pobre”, atirou.

Por sua vez, o bispo da diocese do Moxico, disse estar com o “coração a sangrar” devido à “violência inaudita de Kafunfo com toda a dose de agressão e morte, de desrespeito a vivos e defuntos”.

Para Jesus Tirso Blanco, “nada pode justificar esse tipo de execuções sumárias sem crime cometido”, escreveu o bispo na conta na rede social, considerando que, no passado sábado, “se abriram feridas profundas que não cicatrizarão facilmente”.

Hoje, o bispo católico que tutela a região defendeu o “diálogo como princípio fundamental” para a resolução dos problemas, referindo que depois do 4 de Abril de 2002 (Dia da Paz e Reconciliação em Angola) “nenhum angolano mais iria morrer por causa das ideias que tem”.

Segundo Estanislau Marques Chindekasse, a questão daquela região “é muito mais complexa” e uma manifestação “não se resolve com violência nem de uma parte nem da outra”.

O comandante geral da polícia nacional angolana, Paulo de Almeida, visitou, este domingo aquela região, a garantiu um inquérito para se apurar responsabilidades.

Entretanto, a Angop avança que "estão já detidos 16 manifestantes, cujos processos-crime estão em preparação e serão remetidos ao Ministério Público".

A autonomia da região das Lundas (Lunda-Norte e Lunda-Sul) é reivindicada pelo movimento Protetorado Lunda-Tchokwe que se baseia num Acordo de Protetorado celebrado entre nativos Lunda-Tchokwe e Portugal nos anos 1885 e 1894, que daria ao território um estatuto internacionalmente reconhecido.

Portugal teria ignorado a condição do reino quando negociou a independência de Angola entre 1974/1975 apenas com os movimentos de libertação, segundo o movimento.

Outros artigos do autor

RECOMENDAMOS

POPULARES

ÚLTIMAS