Em 2017, morreram mais de 800 crianças

Casos de desnutrição aumentam no país

Quase metade da mortalidade infantil é associada à desnutrição que é também a 7ª maior causa de mortes. Angola é o 3º país da SADC com mais casos de desnutrição crónica, numa lista liderada pela RDC e Zâmbia. Dados oficiais falam em cerca de 38 por cento, números que podem estar longe da realidade, admite uma responsável do Ministério da Saúde.

Casos de desnutrição aumentam no país
Mário Mujetes

Madalena Van-Dúnem,chefe do Programa Nacional de Nutrição

Em Angola, a taxa de desnutrição crónica é de 38 por cento, quase o dobro do padrão estabelecido pela Organização Mundial de Saúde (OMS), que é de menos de 20 por cento.

Pelo menos, 38 em cada 100 crianças angolanas sofrem de malnutrição crónica e outras 15 em cada 100 de malnutrição severa. Os dados são do último Inquérito de Indicadores Múltiplos de Saúde 2015-2016. Números estes que podem estar “longe da realidade”, admite a chefe do Programa Nacional de Nutrição da Direcção Nacional de Saúde Pública (DNSP). Madalena Van-Dúnem acredita que a quantidade de casos que chegam às unidades sanitárias mostram que a situação se tem “agudizado”. E aponta o baixo poder de compra das famílias como uma das razões para o actual quadro.

Em Angola, a taxa de desnutrição crónica é de 38 por cento, quase o dobro do padrão estabelecido pela Organização Mundial de Saúde (OMS), que é de menos de 20 por cento. No ano passado, o Comité da Organização das Nações Unidas (ONU) afirmou que o país ainda precisa de trabalhar no capítulo da infância com destaque para a desnutrição infantil, um fenómeno que tem piorado nos últimos anos e que está associada a 45 por cento de mortes de crianças. Segundo a Unicef, Angola está na lista dos 20 países onde morrem mais crianças menores de cinco anos, com 81 mortes por cada mil nascimentos.

A ONU recomendou ao Governo a trabalhar na mobilização de recursos financeiros, humanos e técnicos para pôr em acção a Estratégia Nacional de Nutrição e promover uma nova política alimentar e nutricional que dê atenção primordial à nutrição materna e infantil.

Apesar de se tratar ainda de uma forma “muito insípida”, Madalena Van-Dúnem garante que as estratégias estão viradas para a capacitação de técnicos que vão trabalhar na sensibilização nas comunidades. No ano passado, vários deles foram formados em quatro províncias: Kwanzas Norte e Sul, Bié e Huambo. “O programa está a trabalhar na Política Nacional e Multissectorial sobre Alimentação e Nutrição e ainda na elaboração do Plano Estratégico Nacional Multissectorial que poderá estar concluído até ao final do ano”, explica.

Actualmente, Angola conta com 67 centros terapêuticos, mas a intenção é expandir estes centros a todos os municípios e centros de referência. “Temos algumas debilidades no pessoal”, reconhece Madalena Van-Dúnem, que enumera ainda a falta de recursos financeiros como uma das dificuldades do programa. Devido à falta de dinheiro para a aquisição de material terapêutico, muitos dos cerca de 400 postos de saúde com atendimento de nutrição em ambulatório foram extintos. “Alguns já estão a ser reabilitados”, garante.

O relatório ‘A criança em Angola - Uma análise multidimensional da pobreza infantil’, da Unicef, apresentado no final do ano passado, mostra que a incidência mais elevada das privações nas crianças, dos zero aos 23 meses, ocorre na nutrição com cerca de 86 por cento das crianças privadas do recebimento de uma alimentação adequada.

De acordo com o documento, a privação explica-se sobretudo por não existirem padrões alimentares apropriados. Cerca de 80 por cento das crianças com menos de 24 meses sofrem privações no indicador de alimentação infantil, que consiste na amamentação exclusiva de bebés com menos de seis meses e dieta alimentar mínima nas crianças entre seis e 23 meses.

A coordenadora do Programa de Nutrição, Maria Tati, revelou que, em função da taxa de prevalência, Angola está na terceira posição dos Estados da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) mais afectados por casos de desnutrição crónica em crianças até aos cinco anos.

 

Com mais de 80 crianças

Diariamente, chegam à sala de nutrição do Centro da Saúde da Boa Nova, sete a oito crianças. Todas elas com baixo peso e dificuldade no crescimento. Duas características comuns da desnutrição crónica em crianças. Localizado em Viana, em Luanda, estão internados no centro mais de 80 crianças, muitas delas chegam em estado crítico.

De acordo com os nutricionistas, o peso ideal de uma criança de dois anos é entre nove e 13 quilos. Uma realidade tão distante do filho de Domingas Aida. Com quase dois anos, o pequeno tinha apenas cerca de oito quilos. Corpo magro, pele seca e esbranquiçada, o pequeno rejeitava qualquer tipo de comida e apenas limitava-se a chorar. A mãe lembra que o desmamou antes de um ano e que, desde aquela altura, o pequeno passou a rejeitar a alimentação. Há dois meses internado, e com uma alimentação mais controlada, o pequeno ganhou nos últimos dois meses, 500 gramas, estando agora com oito quilos e 500 gramas. A situação do filho de Aida não é isolada. No país, existem mais de dois milhões de crianças que sofrem com a condição. Muitas delas chegaram a falecer.

De acordo com Terezinha António, uma das técnicas de saúde do centro, o desmame brusco e as condições sociais precárias são as principais razões para que muitas crianças acabem desnutridas.

 

Mais de 800 mortes em 2017

O Boletim Epidemiológico da DNSP mostra que, em 2017, mais de 800 crianças com menos de cinco anos morreram devido à desnutrição. O boletim coloca ainda a doença como a sétima com mais mortes notificadas.

Em Benguela, entre Janeiro e Maio do ano passado, foram contabilizados 216 mortes de crianças menores de cinco anos, entre 9.654 casos de internamento por desnutrição aguda grave. No Bié, morreram mais de 160 crianças menores de cinco anos. No centro, foram diagnosticadas e tratadas mais de mil crianças.

 

 

 

 

 

 

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