Ministério da Educação culpa gráficas pelo atraso na reprodução e distribuição

Aulas arrancam sem materiais actualizados

As aulas no ensino geral iniciaram-se sem que determinadas escolas primárias de Luanda tivessem qualquer material curricular actualizado. Os directores são obrigados a remediar com materiais antigos, nos quais já haviam sido detectados “erros” e “insuficiências”. O Ministério da Educação atira a culpa às gráficas contratadas para a reprodução e distribuição dos livros, ao mesmo tempo que assegura resolver o problema ainda esta semana.

Aulas arrancam sem materiais  actualizados
Lourenço Neto,

Lourenço Neto, director do complexo escolar n.º 1.601, no ‘Neves Bendinha’

Estamos a distribuir mesmo [os antigos], enquanto aguardamos pelos actualizados.

Uma semana depois do início das aulas, ainda há escolas públicas de Luanda que não receberam os novos materiais curriculares do sistema pré-escolar e ensino primário, continuando a funcionar apenas com os antigos, nos quais o próprio Ministério da Educação (MED) já identificou “erros” e “insuficiências”. Compostos por planos curriculares, programas de disciplinas, manuais escolares, cadernos de actividades, guias de professores, cadernetas de avaliação e relatórios descritivos, os novos materiais, que são de distribuição gratuita, foram actualizados em Dezembro e deviam já substituir parcialmente os que vigoravam desde 2004. Dados do Instituto Nacional de Desenvolvimento da Educação (Inide), divulgados em finais de 2018, previam a possibilidade de haver uma ‘coabitação’ entre os novos e antigos materiais. Os responsáveis do MED, que asseguraram que a situação duraria apenas um ano (2019), minimizaram qualquer hipótese de a ‘coabitação’ trazer constrangimentos e justificaram a medida com os atrasos nos ‘timings’ entre o pagamento da produção do material e a decisão de se rever e actualizar os conteúdos.

Entretanto, o novo ano lectivo já arrancou e há escolas primárias de Luanda que não receberam qualquer material actualizado. É o caso do Complexo Escolar n.º 1601, no ‘Neves Bendinha’, que congrega 753 alunos no I ciclo (7.ª à 9.ª classe) e 743 no ensino primário (iniciação à 6.ª classe) e cujo director-geral está a distribuir aos alunos materiais restantes do ano lectivo passado. Lourenço Neto, que também está a ‘reutilizar’ os livros devolvidos pelos alunos que passaram para as classes subsequentes, assegura não ter recebido ainda qualquer material resultante da actualização feita pelo Inide. “Estamos a distribuir mesmo [os antigos], enquanto aguardamos pelos actualizados”, revela, acrescentando que os erros contidos nestes materiais, por já terem sido detectados, “podem ser ultrapassados pelos professores”.

Já na Escola Primária n.º 3030, no Cazenga, até chegaram novos materiais, mas Violante Buila, a directora-geral, não está satisfeita, pois se trata de uma quantidade “irrisória”, que não passa de “uma gota de água no oceano”. Sem avançar números, a responsável explica que classes como a 5.ª e a 6.ª, por exemplo, não receberam os estratégicos manuais de leitura, o que obriga a que os pais tenham de os adquirir no mercado informal, embora se trate de materiais cuja venda é proibida. “Eles [os pais] sabem onde os encontrar. Nós todos sabemos onde encontrar esses materiais à venda”, afirma Violante Buila, com um sorriso irónico.

 

A remediar

Na Escola n.º 9020, situada no Wenji Maka II, em Talatona, os mais de 1.500 alunos da primária têm à disposição pouco mais de dois mil livros novos, uma quantidade que o director-geral, Kiakuma António, considera “bastante insuficiente”. Pois, explica o responsável, não há um único manual que abranja todas as disciplinas. Por conseguinte, tendo em conta que em média um aluno da primária tem cinco disciplinas, os números levam a concluir que a quantidade de livros novos não cobre sequer 30 por cento dos alunos. À semelhança de Talatona, o Kilamba-Kiaxi também tem escolas primárias sem os prometidos materiais actualizados, como se verifica na ‘8040’, uma instituição com 12 salas, onde os mais de 600 alunos estudam com o auxílio dos livros antigos, enquanto a direcção, que não aceitou prestar declarações ao NG, aguarda pela chegada dos novos materiais.

Quem parece, no entanto, constituir excepção são os cerca de 500 alunos da ‘1050’, uma escola primária da Maianga, vulgarmente conhecida por ‘Escola da Martal’. Neste estabelecimento, enquanto os responsáveis mostravam ao NG os novos livros, outros tantos caixotes com livros foram chegando. Isabel Lima, a directora-geral, acredita que tudo se deve à “sorte” de a escola ser “pequena”, com apenas seis salas e os alunos distribuídos em dois turnos, funcionando com a preocupação de não exceder o número máximo permitido em cada turma: 35. Além do rigor, a escola tem o privilégio de ter como parceiro social uma construtora que, regularmente, ‘patrocina’ obras à estrutura, permitindo igualmente que as salas contenham ar condicionado.

Em declarações ao NG, o secretário de Estado para o Ensino Pré-Escolar e Geral explicou que o MED assinou um contrato com as gráficas em que se prevê que estas, além da reprodução dos livros, se encarreguem de os colocar nas escolas. Sublinhando que a “distribuição não é da responsabilidade do Ministério”, Pacheco Francisco revela que Luanda ainda não tem cobertura total destes materiais “porque há gráficas que não conseguiram ainda reproduzir a quantidade necessária”. “[As gráficas] estão a ser pressionadas, desde a semana passada, para completarem. Cada gráfica tem praticamente duas ou três províncias sob sua responsabilidade. Estamos a pressionar a gráfica que tem a responsabilidade de atender Luanda.”

Embora assegure que “somente a gráfica de Luanda regista atrasos”, Pacheco Francisco não descarta, por outro lado, que nas outras províncias possa “haver um ou outro caso”. O governante, que não acredita que este “atraso” ponha em causa os objectivos de 2019, lamenta igualmente que haja escolas que “não têm sabido reaproveitar os manuais”, esquecendo-se de os recolher no fim de cada ano lectivo para serem usados no ano seguinte. “Isso não vai pôr em causa nada, porque acredito que, até ao final desta semana, se poderá reverter o quadro”, reforça.

De acordo com o MED, a actualização feita nos manuais não originou introdução de novos conteúdos, pois a “matriz curricular é a mesma”, diferenciando-se apenas na correcção de “erros e insuficiências” detectados nos materiais antigos. Por exemplo, em Geografia, foi actualizada a informação que dava conta de que o país tinha apenas sete barragens. Em História, além da correcção do ano da morte de Jonas Savimbi (2004 para 2002), rectificou-se a informação que referia que o antigo líder da Unita havia sido “ministro das relações exteriores de Angola”, acrescentando-se que Savimbi desempenhou tal cargo no Governo Revolucionário de Angola no Exílio (Grae), que funcionava no Zaire, actual República Democrática do Congo (RDC).

 

 

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