A miragem de 2020

Emídio Fernando

Emídio Fernando Editor executivo do Nova Gazeta

Umas eleições autárquicas não serão um teste para o MPLA. Vão ser uma forma de o povo mostrar descontentamento. No Sambizanga, no ‘Rocha’, mas também em Cacuaco, em Benguela, em Cabinda, no Bié…

Ganha, e cada vez com mais força, a convicção de que a constituição das autarquias é um assunto para ser atirado para longe. Dito de outra forma: não vai haver eleições em 2020, como estava previsto, porque simplesmente não vai haver autarquias.

A resistência do MPLA é bem visível e nem sequer é de hoje. As derrotas eleitorais dos partidos ‘irmãos’, Cabo Verde, Moçambique e África do Sul, serviram sempre de pretexto interno para o MPLA adiar as eleições autárquicas até ao máximo que pôde. Mas as pressões políticas de vários quadrantes, incluindo do estrangeiro, provocaram uma cedência. Mas basta ouvir os dirigentes e deputados do MPLA a falarem das autarquias para se perceber que falta aí muita convicção.

Esse desinteresse vai crescendo quando se olha para os sinais exteriores e para os internos. Em Istambul, na Turquia, o partido de Recep Erdogan perdeu as eleições. Uma derrota que foi um verdadeiro ‘murro no estômago’ ao presidente turco, que já governa o país com punho de ferro desde 2003. E antes liderou precisamente a autarquia de Istambul, durante cinco anos. Perdeu, mesmo usando todos os recursos possíveis, inclusive uma tentativa de fraude eleitoral. O voto de protesto foi mais forte.

Esse é mais um sinal de que as eleições para as autarquias servem também de protesto contra quem está no poder central. E isso começa a ser mais visível em Luanda.

Pela segunda vez, em espaço de meses, o povo saiu à rua, enfrentando as autoridades. Desta vez no Sambizanga, como tinha acontecido no ‘Rocha Pinto’. As pessoas, pouco a pouco, perdem o medo e mostram o cansaço por viverem em condições miseráveis e de serem maltratadas. E isso não se resolve de um dia para o outro.

Umas eleições autárquicas não serão um teste para o MPLA. Vão ser uma forma de o povo mostrar descontentamento. No Sambizanga, no ‘Rocha’, mas também em Cacuaco, em Benguela, em Cabinda, no Bié…

Se já não há medo de enfrentar as autoridades, muito menos receios haverá de votar noutro partido que não seja o MPLA.

E o MPLA, melhor do que ninguém, sabe disso. E tudo fará para adiar a hecatombe. É só estarmos atentos aos sinais.

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